Se não for impedido por uma liminar protocolada pela Advocacia Geral da União no Supremo Tribunal Federal
(STF), o Tribunal de Contas da União deve dar seu parecer, nesta
quarta-feira, sobre as contas de 2014 da presidente Dilma Rousseff. O
governo tentou duas manobras para impedir a votação dos ministros do
TCU: a primeira, pedindo a suspeição do ministro-relator, Augusto
Nardes, junto ao próprio Tribunal; e a segunda, por meio de um mandado
de segurança protocolado no STF pedindo a nulidade da sessão de
apreciação de contas. Segundo o ex-ministro do Supremo, Carlos Ayres
Britto, a politização em torno da apreciação das contas tira o foco
sobre o real papel do Tribunal. "O TCU não é um tribunal julgador de
contas. Ele as aprecia e emite um parecer técnico. Quem julga é o
Congresso. Por consequência, os ministros não são magistrados. Não são
juízes", afirma.
A Advocacia-Geral da União recorreu à Lei Orgânica da
Magistratura para afirmar que o ministro Augusto Nardes revelou seu voto
previamente, e por isso quer impedi-lo de relatar as contas. Isso está
correto à luz da Constituição?
A Lei Orgânica da Magistratura,
sozinha, não dita os ritos de como os ministros devem agir ao apreciar
as contas de um governo. Pois os ministros não são magistrados. Não são
juízes. Da mesma forma que o TCU não é um tribunal julgador de contas.
Ele aprecia as contas e emite um parecer técnico. Ocorre que o regimento
interno do órgão, especificamente o artigo 39, discorre sobre essa
questão, e foi inspirado na Lei da Magistratura. E, como não há
legislação vigente sobre o rito de prestação de contas de um presidente,
o regimento interno do órgão acaba tendo força de lei. E o regimento
diz que é vedado ao ministro a manifestação de opinião sobre qualquer
processo pendente. Caberá, então, ao ministro Nardes, aceitar ou não a
arguição de suspeição de parcialidade sugerida pela AGU. Se ele não se
considerar suspeito, ficará a cargo do colegiado decidir.
O regimento, então, é suficiente para permitir a aplicação de uma lei de magistrados a um indivíduo que não é juiz?
Essa decisão ficará a cargo do STF. Mas, segundo a AGU, na petição
protocolada na terça-feira, as regras do regimento do TCU com base na
Lei Orgânica da Magistratura já vêm sendo aplicadas. A AGU argumenta que
há jurisprudência de ministros que se declararam impedidos por
suspeição. Mas é o STF que definirá se esse embasamento é procedente ou
não.
Se o Tribunal não julga, significa que a presidente não é acusada?
Há uma politização exacerbada do fato que acaba nublando alguns
aspectos técnicos e confundindo a opinião pública. A presidente não pode
aparecer nem como acusada nem como litigante. O Tribunal não tem
competência para condenar a presidente. O processo de contas é
necessário como medida prévia ao julgamento de contas anuais pelo
Congresso Nacional. A competência do Congresso Nacional para julgar as
contas está no artigo 49 da Constituição. Ou seja, o TCU, neste caso,
funciona como um órgão auxiliar ao Congresso. É diferente de um parecer
técnico emitido por tribunais de contas municipais e estaduais, que têm
mais força. No caso de um município, por exemplo, é preciso que dois
terços da Câmara de Vereadores estejam dispostos a rejeitar o parecer do
tribunal de contas para que ele seja invalidado. No caso do Tribunal de
Contas da União, o parecer não pode ser transmutado em decisão porque
ele precisa, ainda, passar pelo crivo do Congresso. Por isso o parecer
do TCU não vincula, não obriga o Congresso Nacional a nada. O Congresso
tem pleno poder para rejeitar o parecer. Por isso é importante frisar
que o que pode acontecer hoje é uma análise, não um julgamento.
O ministro Nardes alega que tudo o que disse sobre as contas é
público e consta de parecer prévio publicado em meados de julho. Essa é
uma justificativa válida?
No caso do STF, o ministro Nardes
pode alegar que não deu opinião ou que sua opinião não influiu no mérito
do voto. Caberá ao governo mostrar provas do contrário. De qualquer
forma, isso exigiria a abertura de um processo que só ocorrerá se o STF
deferir o pedido da AGU. E esse deferimento automaticamente inviabiliza a
sessão de apreciação das contas marcada para esta quarta-feira.
Fonte:Veja/reprodução
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